FILMES NO CINEMA

Como escândalo de racismo e pandemia levaram o Oscar ao seu ano mais diverso

Publicado em 22/04/21 13:00

Atores negros como favoritos em várias categorias, mulheres e cineastas de origem asiática na disputa pelo prêmio de direção: este ano o Oscar bateu o recorde de diversidade, e não apenas graças à pandemia que mudou os planos de Hollywood.

Um dos fatores da mudança foi a reforma iniciada pela Academia, que organiza a premiação de maior prestígio do cinema americano, para ampliar o número de membros e fazer com que reflitam mais o conjunto da sociedade.

"Acho que este Oscar será lembrado como aquele em que as mudanças introduzidas no corpo de eleitores há seis anos, graças ao #OscarsSoWhite, cumpriram as promessa de reforma da Academia", escreveu o ator afro-americano Dwayne Barnes em um artigo para o site especializado Deadline.

O falecido Chadwick Boseman e Viola Davis ("A Voz Suprema do Blues"), Daniel Kaluuya ("Judas e o Messias Negro") e a sul-coreana Youn Yuh-jung ("Minari") têm boas chances de vitória no domingo nas categorias de interpretação. Chloé Zhao, nascida na China, é a favorita para o Oscar de direção por "Nomadland".

A campanha #OscarsSoWhite foi criada em janeiro de 2015 nas redes sociais para denunciar a grande maioria de candidatos brancos indicados por uma Academia composta principalmente por homens idosos anglo-saxões.

Chadwick Boseman e Viola Davis em 'A Voz Suprema do Blues'
Imagem: Reprodução

Sob pressão, a Academia reconheceu em 2016 que seus 6 mil membros na ocasião eram 93% brancos e 76% homens, com idade média de 63 anos. A instituição anunciou que pretendia dobrar o número de mulheres e integrantes de origens diversas até 2020.

A aposta se concretizou no ano passado, quando os profissionais que votam no Oscar passaram a registrar 33% de mulheres e 19% de membros de "minorias sub-representadas" (1.787 pessoas no total).

"Demorou alguns anos para acontecer, mas há muitos motivos para esperar que a mudança não seja uma ocorrência única", escreveu Barnes.

A diretora Chloé Zhao, favorita ao Oscar por 'Nomadland'
Imagem: CHARLY TRIBALLEAU/AFP

"Tempestade perfeita"

Após o #OscarsSoWhite aconteceram mobilizações para exigir o reconhecimento das mulheres em todas as profissões da indústria cinematográfica, à frente e atrás das câmera, impulsionadas pelas revelações do caso Weinstein.

"Tudo isto realmente sacudiu a árvore. E este ano, pela primeira vez, porque a covid-19 atrasou muitas grandes produções... Isso deixou uma espécie de campo aberto", afirma Sasha Stone, fundadora do site Awards Daily, que analisa as premiações do cinema desde 1999.

A "seleção reduzida" de filmes em disputa "por acaso era de produções de cineastas de cor e mulheres", completa ela, antes de observar que "ninguém precisava se preocupar com os números de bilheteria do fim de semana de estreia" para filmes sem estrelas.

Elenco e diretor do filme 'Minari'
Imagem: Emily Assiran/Getty Images

Ao lado dos cinemas fechados e dos espectadores limitados ao streaming, tudo provocou a "tempestade perfeita".

O crescimento expressivo da plataformas de streaming durante a pandemia "certamente é parte" do processo, porque a diversidade na televisão aumentou muito mais rápido que no cinema, confirma Darnell Hunt, sociólogo especializado na representação de minorias da UCLA.

O sucesso do streaming "ajudou a levar à Academia uma gama muito mais variada de filmes do que eles estavam acostumados a assistir, e isto se traduziu nas indicações", completa Hunt, que coordena desde 2014 um estudo sobre a diversidade em Hollywood.

Daniel Kaluuya em 'Judas e o Messias Negro'
Imagem: Divulgação

"Salada"

Os analistas afirmam que os progressos da Academia não devem ser tão espetaculares nos próximos anos, mas Hunt não imagina que o Oscar possa voltar ao que era antes.

"Os sinais estão apontando na direção certa", disse à AFP, ao observar que, além das mudanças no corpo de votantes, a Academia está adotando critérios de elegibilidade para melhor filme que envolvem representação mínima de minorias, mulheres e da comunidade LGBTQIA+, tanto para equipes como para os elencos.

Isto será suficiente para mudar Hollywood em seu conjunto? Stone espera que sim e aponta que prêmios como o Oscar estão cada vez mais separados da bilheteria, "porque se tornaram um nicho".

Mahershala Ali posa com sua estatueta de melhor ator coadjuvante do Oscar 2017 por seu papel em 'Moonlight'
Imagem: Frazer Harrison/Getty Images

Ela recorda, no entanto, que a indústria do cinema busca sobretudo "ganhar dinheiro": "Se os diretores do sexo masculino conseguem mais dinheiro, eles continuarão sendo contratados para os filmes de super-heróis. E se os atores brancos geram mais dinheiro, eles continuarão sendo contratados para os mesmos filmes".

Hollywood "quer ganhar dinheiro, mas também quer ter uma boa imagem o Oscar. É como o McDonald's: vendem Big Macs em todo o mundo, mas tem uma salada que faz com que pareça que se preocupam com a saúde".

"Isto é o Oscar é pra Hollywood: a salada".

Fonte: UOL Cinemas // UOL

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