FILMES NO CINEMA

O Homem de Toronto aposta na dupla protagonista, mas falta um diretor à altura

Publicado em 25/06/22 18:00

Com a simples proposta de unir comédia e ação, O Homem de Toronto é mais uma aposta da Netflix para enriquecer seu catálogo com dois dos gêneros com maior demanda no streaming. Em um momento do cinema em que a bilheteria global é dominada com folga pelos filmes da Marvel, que unem justamente os dois gêneros, apostar na combinação de humor e porradaria muitas vezes é a principal receita para o sucesso.

Para conduzir esse projeto, o principal streaming do mercado confiou o projeto nas mãos de Patrick Hughes, que já fez filmes de duplas improváveis em Dupla Explosiva (2017)e já trabalhou com grandes projetos de ação em obras como Os Mercenários 3 (2014). No caso de O Homem de Toronto, a premissa é tão simples quanto nos filmes citados: após uma confusão com o Airbnb, o trapalhão Teddy (Kevin Hart) é confundido com o assassino de aluguel Toronto (Woody Harrelson) e, para ajudar as autoridades a resolver um crime, precisa sustentar essa falsa identidade.

Após uma boa introdução, logo os personagens se encontram e precisam seguir juntos na missão. O que temos, a partir disso, é uma sequência bem honesta de cenas que misturam ação com comédia. Há uma interessante inversão que rende os melhores momentos do filme, mesmo que ainda incompleta por problemas de direção. Quando uma cena é comandada por Teddy, o texto e as atuações são mais burlescos, despretensiosos, e a entrada de Toronto causa uma ruptura à leveza. Quando é o personagem de Harrelson quem comanda, a entrada de Teddy existe para quebrar a seriedade com alguma piada que rompa a tensão.

Essa proposta funciona durante a maior parte do tempo mas, entre outras questões, os seguidos esforços de O Homem de Toronto para tornar os personagens mais complexos do que eles precisam ser, acabam por tornar a narrativa truncada. A trama principal, que envolve um projeto de atentado à embaixada venezuelana, é constantemente atravessada por dilemas pessoais da dupla protagonista. Esses dilemas, por mais bem-vindos que sejam na teoria, parecem existir apenas para romper os arquétipos de Teddy e Toronto, mas na prática, apenas os trocam por novos. O assassino frio ganha seus traumas e camadas humanizantes, o sujeito carismático oculta um medo do fracasso pessoal descomunal – a ideia de palhaço deprimido –, e por aí vai.

Já sobre os problemas de direção, o que parece faltar para que O Homem de Toronto seja mais do que um incremento numérico ao catálogo da Netflix é um esforço de Hughes para que a mise-en-scene como um todo acompanhe as mudanças de tom propostas pela dupla protagonista. Como dito, Teddy impõe o humor, Toronto a ação, e essa dinâmica se inverte. A questão é que o tom é estabelecido principalmente pelo roteiro e pelas atuações, mas pouquíssimo pelas articulações visuais. Não há elementos de direção, montagem e fotografia que acompanhem essas mudanças e inversões de tom, o que deixa O Homem de Toronto, como cinema, um pouco genérico.

Funcionando principalmente pela força de seus astros principais, o novo filme da Netflix é uma mistura de ação e comédia eficiente graças à química estabelecida entre eles, mas é o tipo de filme que deixa aquele gostinho de que poderia ser melhor. Poderia ousar um pouco mais, permitir que os gêneros trazidos pelo duo principal também afetem a forma como cada cena é filmada e conduzida para além do roteiro.

Fonte: Omelete // Matheus Fiore

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