FILMES NO CINEMA

Kleber Mendonça Filho acusa Bolsonaro de querer destruir a cultura do Brasil

Publicado em 11/05/19 22:00

Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, diretores de "Bacurau", que concorre à Palma de Ouro no Festival de Cannes, acusam o presidente Jair Bolsonaro de querer acabar e destruir o "melhor embaixador" do país: a cultura.

"[Bolsonaro] Não apenas ameaça desencorajar, mas também criminalizar um sentimento que é muito natural a qualquer nação, que é ter artistas e que eles façam arte", disse Mendonça Filho em entrevista à Agência Efe.

O pernambucano voltará a passar pelo tapete vermelho do prestigiado festival francês, que terá início no dia 14 de maio, três anos depois participar com "Aquarius". Agora, no entanto, ele divide a direção com Dornelles, que também tem sérias críticas às políticas do governo Bolsonaro.

"Ele está fazendo um trabalho de destruição completa de tudo o que foi conquistado em governos de esquerda anteriores, e acho que o cinema está dentro desse sistema de destruição", opinou.

Parceria antiga

A boa sintonia entre a dupla de cineastas vem de longa data. Eles trabalharam juntos em alguns curtas, como "Eletrodoméstica" (2005) e "Recife Frio" (2009), e também nos aclamados longas "O Som ao Redor" (2012) e o próprio "Aquarius" (2016), quando Mendonça Filho dirigiu e com Dornelles atuou como diretor de arte.

Agora, eles voltam a unir forças em "Bacurau", uma coprodução franco-brasileira que vinham amadurecendo há uma década e que resultou em um filme que poderia fazer parte do gênero faroeste, com algumas referências do cinema americano dos anos 70, segundo Dornelles.

Protagonizado por Sonia Braga e pelo alemão Udo Kier, o filme conta a história de um povoado fictício do Nordeste, chamado Bacurau, que desaparece dos mapas depois da morte de uma das suas moradoras mais queridas, Dona Carmelita.

"A ideia de estar no mapa está muito relacionada à política e ao poder e transcende o meramente geográfico. Ser visto no mapa é uma questão de uso de poder e de estar subjugado a um determinado poder", explicou Mendonça Filho, sem dar mais detalhes, já que a produção terá estreia mundial no Festival de Cannes.

Retrato do Brasil

Nesse sentido, eles acreditam que o filme pode ser lido como o reflexo de "um pedaço do Brasil" e "uma representação honesta e correta da sociedade brasileira". Ao contrário de "Bacurau", o Brasil está atualmente muito presente no mapa, embora como algo "preocupante" pela ameaça que Bolsonaro representa para a cultura, segundo Mendonça Filho, que considera que desde a cassação da então presidente Dilma Rousseff, em 2016, o país "vem perdendo o sentido democrático".

No final de abril, Bolsonaro anunciou a intenção de limitar a verba pública aos artistas e revisar a política de patrocínio da Petrobras a projetos culturais.

"Tenho muita dificuldade para entender por que esse desejo de acabar com o movimento da cultura, que na verdade é uma indústria e é estratégica porque é a identidade de país", questionou Mendonça Filho.

Dornelles, por sua vez, lembrou que "outros já tentaram" colocar a sobrevivência do cinema brasileiro em risco e não conseguiram, por isso ele disse que espera que o "retrocesso, já inegável, não seja tão grande quanto parece".

Esse cenário pessimista contrasta com a boa recepção que as produções brasileiras, entre elas "Bacurau", tiveram nas diferentes seções do Festival de Cannes. Por isso, a melhor resposta que pode ser dada ao governo, na visão de Dornelles, é continuar trabalhando para mostrar que o cinema "é essencial para a identidade de um povo" e "para a construção de um país".

"Somos um setor importante e estamos trabalhando, não cometendo crimes. Estamos representando o Brasil de forma positiva no mundo", defendeu.

O que Mendonça Filho completou: "A cultura acaba sendo um embaixador do país e 'Bacurau' vai continuar representando o Brasil porque a vitrine de Cannes o promoverá internacionalmente", concluiu.

Teaser de "Bacurau"

UOL Entretenimento

Fonte: UOL Cinemas // Carlos Meneses Sánchez

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