FILMES NO CINEMA

Brasileira viveu terror com psicopata de "Dirty John": "Eu dormia com uma faca"

Publicado em 25/03/19 06:00

A Netflix lançou recentemente a versão em documentário sobre a história dramatizada na série "Dirty John - O Golpe do Amor", disponível no serviço de streming desde fevereiro, que conta a história de John Meehan, que aplicava golpes em mulheres em busca de dinheiro e as ameaçava quando não cediam. Chamado de "Dirty John: A Verdade Nua e Crua", o filme tem pouco mais de uma hora e explora mais os relacionamentos dele que os relatados na série, incluindo a história da brasileira Marileide Andersen, uma das vítimas de John, que morreu assassinado a facadas em 2016 pela filha de Debra Newell, sua última mulher.

A história do golpista é complexa. A série de oito episódios é baseada em relatos reais de artigos sobre crimes contados por Christopher Goffard em seu podcast, do Los Angeles Times. John Meehan seduzia mulheres e se casava com elas para roubar seu dinheiro. A produção da Netflix foca em John, interpretado por Eric Bana, sua última vítima, Debra Newell, vivida por Connie Britton, e no primeiro casamento dele com a enfermeira Tonia Sells (Sprague Grayden), que descobriu depois de 10 anos de relacionamento que John a traía, era viciado em drogas e traficava remédios.

John Meehan e Marileide Andersen durante o namoro Imagem: Reprodução

Marileide Andersen não é retratada na série, mas tem sua história bem explorada no documentário. A brasileira, de 54 anos, conseguiu colocar John Meehan na cadeia após tentativa de extorsão e ameaças de morte. A escritora nasceu em Belém (PA) e mora nos Estados Unidos há mais de 20 anos. Ela conheceu John no final de 2012 em Laguna Beach, no Condado de Orange, na Califórnia, onde vive atualmente, após passar por uma cirurgia no cérebro devido a descoberta de um tumor. John trabalhava no hospital e se apresentou como médico anestesiologista - na realidade, ele fazia parte da enfermagem.

A escritora estava se separando do então marido, um empresário americano com quem foi casada por duas décadas e herdou o sobrenome Andersen. Marileide se deixou seduzir por John Meehan e dois engataram um romance no início de 2013. Fragilizada com o aumento de peso e com a separação, a escritora diz que recuperou a autoestima com John, que era bonito, com corpo atlético e charmoso.

A desconfiança do golpe

O relacionamento com John Meehan durou um mês. Tempo curto, mas intenso. Em entrevista ao UOL, Marileide Andersen contou seus momentos de alegria e terror que viveu em pouco tempo de convivência com John Meehan. A brasileira já estava apaixonada quando John começou a dar sinais de que não era a pessoa que ela acreditava ser.

"Percebi que ele estava se distanciando, porque ele perguntava das minhas coisas e eu não respondia o que ele queria saber, se havia ganhado dinheiro com a separação do meu ex-marido, se pretendia entrar na Justiça. John também falava que trabalhava em vários hospitais, mas nunca dizia onde eles se localizavam", relata ela.

Certa vez, John disse que iria apresentar um médico que trabalhava com ele em um hospital para uma amiga da escritora. Curiosa, a amiga queria saber quem era o tal médico antes de conhecê-lo pessoalmente e foi até o hospital mencionado por John. Lá ela descobriu que não havia nenhum John Meehan no corpo de funcionários e muito menos existia o amigo.

"Fiquei com aquilo na cabeça. Mas passou um tempo e combinamos de ir para uma festa em Hollywood no dia do Oscar. Eu fui primeiro e estava me arrumando no hotel quando ele apareceu usando uniforme, ele só usava aquele uniforme. Quando chegou no hotel, ele dormiu. Fiquei com dó pois achei que ele havia trabalhado muito. Mas fiquei cismada e mexi nas coisas dele. Abri sua mochila e encontrei bolos de dinheiro, duas armas e remédios. O questionei e ele me disse que muitos de seus pacientes pagavam em dinheiro vivo", conta.

O verdadeiro John Meehan, que teve sua vida retratada no documentário e na série da Netflix "Dirth John" Imagem: Reprodução

Marileide ficou mais desconfiada e começou a pesquisar o nome de John Meehan na internet e encontrou em um site de psicopatas procurados por enganar mulheres. A brasileira descobriu também que John não era médico e já havia sido preso em 2002, após denúncia de sua primeira mulher, Tonia - com quem ele teve duas filhas - por roubar remédios do hospital que ele trabalhava e por participação na morte de um irmão.

Marileide confrontou o golpista, que chegou a mostrar a ela diplomas falsificados. "Um dia, quando cheguei em casa, encontrei folhas do livro que escrevia espalhadas pelo chão e um recado na porta com uma folha que ele arrancou do meu passaporte: 'precisamos conversar'. Ele também tinha levado de casa pedras preciosas, relógios, tudo sumiu. Levei um choque e fui até a polícia. Estava com muito medo".

A policial, que dá seu depoimento no documentário da Netflix, pediu o nome completo de John Meehan e chegou a ligar para ele pedindo para que não fosse mais atrás de Marileide. "Onde eu morava tinha um sensor e o meu quarto ao lado tinha uma escada que se alguém descesse a luz acendia. E estava acontecendo sempre. Sabia que era o John, por isso dormia com uma faca e um taco de beisebol".

Para se livrar de uma vez de John, a brasileira teve uma ideia. Ela ligou para o golpista e mentiu dizendo que precisava ir ao Brasil retirar um dinheiro no valor de US$ 10 milhões (cerca de R$ 37 milhões) e perguntou se ele não queria ir junto. John aceitou e Marileide pediu a cópia do passaporte para emitir a passagem. Além disso, mentiu dizendo que iria transferir o dinheiro para a conta de John, já que a sua era conjunta com o ex-marido.

Para conseguir o endereço, a brasileira o enganou sobre a compra de uma casa. "Combinei tudo com uma amiga corretora. Ele foi comigo e gostou de uma das casas. A corretora disse que aquela estava quase vendida, mas que eu poderia dar um cheque para segurar. E como minha conta era conjunta com meu ex-marido, falei que não tinha cheque. Ele 'caiu na rede' e ofereceu o cheque de US$ 30 mil, que óbvio, estava sem fundo. Mas pelo menos tinha o endereço dele".

Dias de terror até a prisão

A polícia americana e Marileide armaram um esquema para prender John. A brasileira marcou de se encontrar com o golpista em um café onde teria policiais à paisana, mas John descobriu a armadilha e passou ameaçá-la de morte.

John exigia os US$ 37 milhões que a brasileira havia dito que transferia para a sua conta. "Quando ele descobriu que eu falei aquilo para pegar o passaporte e o endereço e dar para a polícia, as coisas pioraram e ele passou a me seguir para me matar", relata.

A escritora brasileira Marileide Andersen foi uma das vítimas de John Meehan Imagem: Reprodução/Facebook

No documentário "Dirty John: A Verdade Nua e Crua", a policial classifica Marileide como "multimilionária" e "uma famosa escritora brasileira", o que ela contesta. "Eles editaram muito a minha entrevista. Eu jamais disse que era multimilionária nem escritora famosa. Isso me prejudicou muito. Eu fingi que tinha todo aquele dinheiro para conseguir o endereço dele. Não sou milionária, não moro em mansão, eu trabalho. Eles colocaram tudo aquilo para conseguir mídia", disparou ela.

"Foi um mês de namoro e dois meses de perseguição, medo e sofrimento para essa loucura acabar. Até que finalmente ele foi preso". John Meehan se declarou culpado da posse de uma arma de fogo, roubo e perseguição e foi preso. Marileide passou um tempo no Brasil.

Mais vítimas e a morte

A série "Dirty John - O Golpe do Amor" não conta a história de Marileide Andersen, mas retrata o último golpe de John Meehan, cujo apelido, "Dirty John" (John Imundo), foi dado por amigos da faculdade de Direito, que conheciam alguns outros golpes de John, como se jogar na frente de carros e ser atropelado para depois processar seguradoras e colocar cacos de vidro em pratos nos restaurantes para ganhar indenização.

Da criadora Alexandra Cunningham, a trama foca em Debra, que conheceu John Meehan em um aplicativo de encontros dois dias depois que ele deixou a cadeia, em 2014. A designer mergulhou nesse relacionamento, ignorando os alertas de sua família, que se mobilizou para descobrir quem era aquele homem misterioso.

$escape.getH()uolbr_geraModulos('embed-foto','/2019/john-meehan-e-debra-newell-foram-interpretados-na-serie-pelos-atores-eric-bana-e-connie-britton-1553209422507.vm')

Mãe de quatro filhos, dos quais aparecem na série Jacquelyn (na ficção, ganhou o nome de Verônica e é interpretada por Juno Temple) e Terra (Julia Garner), Debra se casou escondido com John dois meses depois de conhecê-lo. As filhas da designer não aceitavam John. Em 2015, depois da pressão familiar, ela começou a investigar os documentos de John e encontrou evidências de sua longa história de seduzir, enganar e assediar mulheres.

Transtornada, Debra saiu da casa onde os dois moravam aproveitando a ausência de John enquanto ele estava no hospital para uma cirurgia nas costas. John conseguiu enganar Debra com justificativas para seus crimes e meses depois, eles se reconciliaram.

Um ano depois de uma série de acontecimentos, Debra estava cada vez mais desconfortável com o afastamento de suas filhas e com o comportamento de John. Ela entrou com um pedido de anulação do casamento em abril de 2016. Ele passou a aterrorizá-la e ameaçar suas filhas. Em agosto, Terra voltou do trabalho e deixou o carro no estacionamento do lado de fora do prédio de apartamentos de Newport Beach, na Califórnia.

Quando ela saiu do carro, John se aproximou por trás e atacou-a com uma faca. Durante a luta, Terra chutou a arma da mão de John, e em seguida, conseguiu agarrá-la e esfaqueá-lo 13 vezes. John Meehan morreu no hospital aos 57 anos, quatro dias depois de sua luta com Terra. No documentário, Debra disse que se sentiu aliviada pela morte do ex-marido. Marileide lamentou como as coisas aconteceram e Tonia afirmou que suas duas filhas foram o melhor presente que John poderia ter lhe dado.

Fonte: UOL Cinemas // Gisele Alquas

Veja também